Silvina
Marques Mateus
4-5-1924 a 20-1-2009
Montijo, 20 de Janeiro de 2009.
17h25.
Morreste hoje, Vó.
Já me sentia preparado, depois de tantas correrias, juro que pensava que sim, mas a notícia crua pelo telemóvel desfez as minhas pernas em pó.
Morreste hoje, Vó.
Todas as memórias da tua face, dos teus gestos, da tua maneira, atingiu-me como um tsunami devastando tudo à sua frente. Arrasou-me e deixou-me dormente, afogado em éter.
Morreste hoje, Vó.
Tudo o que por ti fiz parece uma gota de água no oceano, um cêntimo nas maiores fortunas, uma mesquinhez tamanha. Sem comparação.
Morreste hoje, Vó.
A tua partida explodiu no meu coração como uma bomba de vidros. O meu coração sangra...
Morreste hoje, Vó.
E eu lembro-me...
Lembro-me do teu riso que deixava sempre um sorriso na minha cara.
Lembro-me da tua vontade de me fazer a minha vontade, mesmo contra a minha vontade.
Lembro-me de quando foste o meu amparo, nos meus jovens anos de adulto, enquanto decidia o que era a minha vida e protelava, gastando o que ganhava, enquanto que o pão da minha boca provinha do teu sustento.
Lembro-me do teu amor puro, que tudo davas e nada pedias em troca, que davas mesmo quando eu te rejeitava, que davas quando eu nem sequer sabia, que davas quando eu não te agradecia.
Lembro-me da tua dedicação quando eu estava doente, nunca me faltando nada.
Lembro-me dos teus mimos em gestos insignificantes quando para ti e para a tua idade já te custavam tanto, e que eu tanto descaso dava.
Lembro-me de quando te despachava, quando vinhas contar-me as tuas histórias, o teu dia, as tuas novelas da tv e o marinheiro na série JAG, e quando eu dizia que não queria saber, só dizias: "É só pra conversar um pouco contigo.". Tanta solidão que te presentei.
Lembro-me da tua felicidade por um carinho meu, um beijo, uma brincadeira. O quanto tu sorrias.
Lembro-me de todos os esforços e sacrifícios que fizemos agora, nestes últimos meses, para que melhorasses, para que te deixasse confortável, o quanto chorei à tua beira e não saber se me compreendias.
Eu lembro-me Vó e tive a felicidade e o descernimento de te dizer o quanto te adorava quando ainda me percebias.
Morreste hoje, Vó.
Morreste, mas ficas eternamente.
Não só na minha memória.
Não só na memória de todos os que conheceste.
Eu, com a minha reduzida insignificância neste mundo, fiz-te o que sei fazer melhor: uma página neste mundo global que é a Internet.
É um marco pra mim, uma prenda rídicula comparado com tudo o que fizeste por mim, mas é um mural... onde te posso visitar sempre que quiser e estarás aqui para sempre... presente.
Morreste hoje, Vó, mas a tua memória persiste em mim, na tua família, e agora aqui, para quem cá passar e visitar, conhecer momentos da tua vida tão cheia.
Até breve, que sei que não te vais afastar por muito. Onde quer que estás sei que olhas por nós, e fico mais feliz por isso.
Um beijo e descança em paz...